A não volta das crianças à escola
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No último mês, a cada diretor de escola particular que conversava, uma afirmação sempre aparecia: “não sabemos o que vai ser do ensino infantil”. A frase vinha depois do período de matrícula e o diagnóstico era o encolhimento - e, por vezes, esvaziamento total - deste segmento. A consequência, diziam, chegava nos primeiros anos e poderia impactar a alfabetização desses alunos, que ocorre no primeiro ano dessa faixa. Eram percepções que posteriormente foram comprovadas. De acordo com o Censo Escolar, divulgado no final de janeiro, as matrículas nas creches e pré-escolas tiveram quedas e não foram absorvidas pelo colégio público. São 600 mil alunos fora da sala de aula em um ano.
Pais, durante 2020, puderam criar seus filhos em casa devido ao expediente remoto e a impossibilidade de um retorno presencial às escolas. Em 2021, a maioria das escolas puderam retomar o presencial, mas o receio da ausência de vacinas para crianças e a crise econômica parecem ter influenciado os responsáveis a manterem o comportamento do ano anterior, mas há consequências.
A primeira delas é do ponto de vista da formação, no caso, a alfabetização. Relatório elaborado em fevereiro pelo Todos pela Educação mostra que o número de alunos, entre 6 e 7 anos, que não sabem ler e escrever cresceu 66%. É necessário ressaltar que prefeituras e governos do Estado tentaram soluções remotas de maneira díspares na qualidade, mas o quadro geral evidencia que a sala física e a relação com o professor é fundamental para a alfabetização.
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Outro ponto é anterior à própria alfabetização, que é a importância da interação de uma criança com ambientes sociais - que incluem outras crianças - para além do universo familiar. Segundo um artigo assinado por pesquisadores do “Center on the Developing Child”, da Universidade de Harvard, é fundamental que as crianças possuam interações diversas entre o nascimento e os 5 anos idade, já que esse período é quando as suas funções cognitivas superiores atingem os maiores níveis em suas vidas, ou seja, você adquire habilidades e molda o seu cérebro de maneira mais eficiente para os desafios. Logo, quanto mais experiência, mais repertório aquela criança terá.
É evidente que a pandemia impôs limites na vida de todos e isso gera impactos que deverão ser observados e trabalhados para atenuar seus danos. Mas, a criança é a mais vulnerável dos públicos de nossa sociedade e, por isso, é fundamental que se demonstre a importância e a necessidade da presença delas nas escolas. Para isso, exemplos de políticas públicas começam a aparecer na cidade do Rio e no Maranhão de busca ativa para convencimento dos pais sobre a necessidade - e a garantia de segurança sanitária - para a volta.
Mais uma vez, não se pode fazer política pública que impacta em níveis nacionais de forma pontual. Tivemos essa lição quando não ocorreu uma política conjunta de esforços entre o governo federal e os estaduais e municipais para a vacinação e para a implantação do ensino remoto. Não podemos errar de novo nesta lição.